Sem acordo sobre a PEC do estouro na Câmara, aliados do presidente eleito, Luiz Inácio Lula da Silva (PT), voltam a cogitar a possibilidade da edição de uma medida provisória (MP) com força de lei para retirar o Bolsa Família do teto de gastos. Essa opção já havia sido ventilada no início dos trabalhos da equipe de transição, mas foi deixada de lado por ser uma medida arriscada para o futuro governo.
Membros da equipe de transição já articulam a alternativa, que tem como planejamento esperar a posse de Lula para conseguir editar a medida provisória e não depender do presidente Jair Bolsonaro (PL). Enquanto isso, os articuladores intensificam as consultas ao Tribunal de Contas da União (TCU), responsável por analisar a abertura de crédito extraordinário para a deliberação.
Para conseguir a excepcionalidade de créditos por meio de uma MP, seria necessário "justificar a urgência e imprevisibilidade" dos gastos. Se não obedecer aos critérios, a manobra poderia ser considerada uma pedalada fiscal, o que causou o impeachment da presidente Dilma Rousseff, em 2016.
"Se o governo eleito se utilizar da via da medida provisória, que é uma norma infraconstitucional, abaixo da Constituição, estaria praticando um ato de inconstitucionalidade. Ou seja, uma conduta totalmente incompatível com a nossa Constituição", alerta o professor de direito Constitucional e especialista em gestão e políticas públicas, Fabio Tavares Sobreira.
"A abertura desse crédito por meio de medidas provisórias se destina a despesas que preencham os dois requisitos. Qualquer afronta do Poder Executivo ao texto Constitucional configura crime de responsabilidade", completa.
Por outro lado, o presidente do Tribunal de Contas da União (TCU), Bruno Dantas, sinalizou nesta sexta-feira (16) que o governo eleito não enfrentaria obstáculos caso precisasse aprovar uma MP para garantir o Bolsa Família no valor de R$ 600.
Segundo Dantas, há precendentes no TCU para edição de uma medida provisória, como a que foi feita na semana passada, quando o tribunal liberou o governo para editar uma MP no valor de R$ 7,5 bilhões para pagar aposentados. Dantas ainda indicou que a corte não necessariamente precisaria ser consultada sobre o tema.
"Se vai ser por PEC, por lei, por orçamento ou por medida provisória, nós não temos gestão. O que nós temos é a responsabilidade, a partir de um ato, de examinar se ele é ou não incompatível com a lei", comentou Dantas.
Resistência na Câmara
O texto da PEC tem sofrido resistência no Congresso por dois motivos principais: o valor da proposta, que é de R$ 175 bilhões, e o prazo que o programa de transferência de renda ficaria fora do teto de gastos — regra que limita o crescimento das despesas à inflação do ano anterior.
Inicialmente, o PT queria que o programa social ficasse fora do teto de gastos de forma permanente. Depois, esse tempo foi flexibilizado para quatro anos, que é a duração do mandato de Lula na presidência. No Senado, a proposta foi desidratada, para ter validade de dois anos.
Na Câmara, o diálogo com opositores do governo eleito é mais duro. Parlamentares têm pressionado para que o projeto tenha validade de um ano e com valor menor do que o aprovado no Senado.
No entanto, a expectativa ainda é pela aprovação da PEC. Lideranças petistas calculam aproximadamente 245 votos favoráveis à proposta, que se somariam a outros 90 votos articulados pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL). Juntos, o cálculo é de 335 deputados votando pela aprovação, sendo que o mínimo necessário é de 308. A dúvida é se todos esses parlamentares descartariam qualquer tipo de mudança.
Ainda que o texto volte ao Senado, o presidente da Casa, Rodrigo Pacheco (PSD-MG), disse que a prioridade será pela PEC. "Ela é importante para o Brasil e para a viabilização de uma lei orçamentária que votaremos na sequência", justificou.
Pacheco acredita que há clima para aprovar a proposta e que Lira está comprometido com a pauta. "Acredito que a Câmara vai apreciar e aprovar. E, uma vez aprovada, tem meu compromisso de uma promulgação imediata em uma sessão do Congresso”, adiantou.
Pressão por aprovação
Durante a semana, o relator-geral do Orçamento de 2023, o senador Marcelo Castro (MDB-PI), disse que o funcionamento do próximo governo depende da aprovação proposta. "O Brasil não funcionaria com o orçamento enviado ao Congresso Nacional. Qualquer que fosse o presidente eleito, chamasse ele Bolsonaro, Lula, Simone Tebet, Soraya Thronicke, não é questão de governo ou de presidente, é de Estado", disse.
Castro disse que espera que os deputados aprovem a proposta nesta semana, porque depende do espaço aberto no orçamento para fechar as contas.
A discussão do relatório da proposta, que deveria ter acontecido na quinta (15), foi adiado para a próxima terça-feira (20). Por se tratar de uma mudança na Constituição, a PEC precisa ser aprovada em dois turnos por, no mínimo, 308 votos dos 513 parlamentares da Casa.
Fonte: R7
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