Enquanto o valor dos combustíveis dispara acima dos preços da maioria dos outros produtos no país, o salário mínimo mal consegue cobrir as perdas da inflação.
Em janeiro de 2019, primeiro mês do atual governo, era possível comprar, no preço médio aferido pela ANP (Agência Nacional do Petróleo, Gás Natural e Biocombustíveis), 233,8 litros de gasolina comum com o piso nacional, na época em R$ 998. Trinta e dois meses depois, em agosto de 2021, com os atuais R$ 1.100 só é possível adquirir 185,7 litros .
Se a intenção fosse suprir essa diferença de 48,1 litros (carros populares têm tanques de, em média, 50 litros) no orçamento dos motoristas, o salário mínimo deveria ser reajustado para pouco mais de R$ 1.384,00, e não para os R$ 1.169 previstos na proposta de orçamento para 2022 enviada pelo Palácio do Planalto ao Congresso na terça-feira (31).
O diretor-técnico do Dieese (Departamento Intersindical de Estatística e Estudos Socioeconômicos), Fausto Augusto Júnior, explica que o mínimo tem como função repor as perdas da inflação no período anterior, o que não tem ocorrido.
"De 2020 para 2021, o resultado do INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) ficou acima do reajuste estabelecido pelo governo, de R$ 1.045 para R$ 1.100, e a diferença foi ignorada", analisa.
Ele diz que neste ano o valor enviado ao Congresso também pode ficar defasado e precisará ser corrigido em janeiro de 2022, já que a União previu em seus cálculos um reajuste de 6,2% no piso nacional.
Mas tudo indica que o INPC superará esse índice
FAUSTO AUGUSTO JÚNIOR, DIRETOR-TÉCNICO DO DIEESE
O INPC (Índice Nacional de Preços ao Consumidor) é usado para o reajuste do piso salarial, pois é um indicador que representa a inflação de uma parcela considerável da população.
Conforme o IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística), o índice é muito fiel à variação de preços sofrida pela população com rendimentos mensais entre 1 e 5 salários mínimos, com abrangência em dez regiões metropolitanas do país. Ou seja, a utilização do INPC, em tese, leva à manutenção do poder de compra.
Fausto Augusto acrescenta que o aumento da gasolina afeta diretamente a classe média, que deixa mais dinheiro nos postos, mas também as pessoas mais pobres, normalmente as mais prejudicadas pela inflação.
"Uma hora ou outra a tarifa do tranporte público vai subir e, em um curto prazo, o custo a mais de indústrias e lojas com o combustível vai ser repassado para o consumidor", avalia.
Defasagem
A gasolina custava, de acordo com os boletins mensais da ANP (Agência Nacional de Petróleo), R$ 4,268 em média no país em janeiro de 2019. E saltou para R$ 5,922 no balanço mais recente publicado pelo órgão. Ou seja, o reajuste foi de 38,75%. O INPC, no mesmo período, ficou em 15,69%, segundo a calculadora do Banco Central.
Se pela média nacional do preço dos combustíveis o brasileiro perdeu a capacidade de comprar quase 50 litros de gasolina, a situação é pior em alguns estados.
Em Santa Catarina, o mínimo do início de 2019 permitia adquirir 248 litros de gasolina comum (a R$ 4,017 o litro). Hoje, dá apenas para 192 (R$ 5,712), ou 56 a menos.
"Itens como gasolina e luz têm um impacto muito grande na inflação porque afetam não só quem compra e usa esses produtos, como indiretamente toda a cadeia produtiva, que joga para o preço final os gastos com combustíveis (frete, transporte de trabalhadores) e com o custo da produção, que fica mais salgado com o aumento na eletricidade", diz Fausto Augusto Júnior.
Outro lado
Procurado, o Ministério da Economia disse por e-mail que não iria comentar a reportagem. Em diversas ocasiões neste ano, o presidente Jair Bolsonaro atribuiu aos governadores a culpa pela elevação dos combustíveis, que não aceitariam reduzir o valor do ICMS cobrado nos postos de gasolina.
"Se está R$ 6 ou R$ 7 o litro, o que é um absurdo, e o imposto federal na casa dos R$ 0,70, vamos ver quem está sendo o vilão nessa história. Não é o governo federal", afirmou, em 18 de agosto, ao atribuir o preço elevado ao valor recebido pelos Estados.
O cálculo de Bolsonaro se refere justamente ao percentual destinado a CIDE e PIS/Pasep e Cofins. Na verdade, os preços atuais são reflexo das movimentações para conter a defasagem em relação ao preço do petróleo no mercado internacional e a desvalorização do real.
Ou seja, mais de 70% do preço do litro da gasolina e do diesel na bomba corresponde ao lucro da Petrobras e a tributos estaduais e federais.
Fonte: R7
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