As novas restrições para o comércio de São Paulo vão "arrebentar" empregos e empresas pequenas e médias, afirma o presidente da Ablos (Associação Brasileira dos Lojistas Satélites), Tito Bessa Júnior.
Boa parte do Estado voltou para a fase vermelha do Plano São Paulo na última segunda-feira (25), que prevê o funcionamento apenas de serviços essenciais. Outras áreas, como a capital e a Baixada Santista, voltaram para a fase laranja, e lojas e shoppings passaram a fechar às 20h durante a semana e durante todo o dia aos sábados e domingos.
Para Bessa Júnior, as empresas vão dispensar no mínimo 10% dos funcionários, sendo que, se as restrições foram mantidas por um período maior, algumas irão fechar as portas. O empresário estima que o estado pode perder uma Ford por dia, em alusão ao fechamento das fábricas da montadora no Brasil, com a dispensa de 5 mil funcionários.
Ele avalia que os shoppings se preparam para o combate à pandemia e realizam todas as medidas protocolares, como medição de temperatura, disponibilização de álcool em gel e distanciamento na praça de alimentação. Diz que os lojistas acabarão "pagando o preço" com as novas medidas, no entanto, enquanto aglomerações em outros locais, como praias, não são combatidas.
Veja trechos da entrevista:
R7 - Qual o impacto dessas medidas mais recentes do governo de São Paulo nos serviços não essenciais, como shoppings, galerias e lojas de rua?
Tito Bessa Júnior - Vão arrebentar os empregos, as pequenas e médias empresas vão arrebentar, simples assim. Pegou dois dos meses mais fracos do ano, janeiro e fevereiro sempre foram meses complicados, mas é assim. Agora, o que ele fez no final do ano passado e no início deste ano, de fechar sábado e domingo, não resolveu. Está provado que fechar sábado e domingo não resolveu. Agora reduzir horário de funcionamento, diminuir circulação, isso resolve?
Cientificamente, os imunologistas falam, a propagação não é por conta de shopping, comércio, é por conta de balada, praia, aglomeração, o negócio está lá, não está no shopping. Por que vai punir o shopping? Por que vai arrebentar com o varejista? Como nós vamos pagar as contas? A gente já tem conta alta para pagar, já estamos enfrentando a resistência dos empreendedores de shopping, e agora do governo, como vai dar? A gente vai vender 40%, 50% do que se vendeu no ano passado, não tem auxilio do governo dessa vez, então você vai vender metade ou menos, você vai pagar o funcionário 100%, como vai fazer? Vai desempregar. Eu mesmo estou vendo para mandar gente embora, todo mundo está vendo. Ou fechar o estabelecimento. Não faz o menor sentido. “Ah vamos funcionar das 12h às 20h, das 14h às 22h no fim de semana”, mas agora fechar 100%? Não é no shopping. Fecha as praias, limita a praia, limita a balada, agora bater na gente, nós não somos o propagador, por que pagamos a conta?
R7 - Quanto o setor emprega no estado de São Paulo atualmente? Como é o cálculo para a conclusão de que se as medidas atuais forem mantidas São Paulo vai perder uma Ford por dia?
Júnior - O setor de shopping centers emprega 1,1 milhão de pessoas de forma direta. O estado de São Paulo representa 50%, 60% do número de shoppings centers que existem no Brasil. Então temos aí 600 mil empregos, cada emprego direto, ele é responsável por três ou quatro empregos indiretos, porque tem toda a estrutura por trás. Então nessa cadeia, nós estamos falando em 2 milhões, 2,5 milhões de empregos. Isso só em comércio de shopping, não estou colocando comércio de rua, salão de beleza e restaurante, mas é fácil chegar em uns 5 milhões de empregos no total. Você imagina quantos salões existem, restaurante, agência, turismo... Fechou tudo. Talvez até passe de 5 milhões. Se 10% dessas empresas não aguentarem, seja filial, numa cidade do interior, nesse esquema não aguenta, vai fechar. Eu tenho lá 6, 7 funcionários, uma parte vai perder o emprego, porque não vai mais ter o cara que limpa a loja, o outro que entrega tal coisa e assim por diante. É uma reação em cadeia. Se de 5 milhões, 10% perderem o emprego, são 500 mil. Nós estamos mexendo com o setor que mais emprega no país, é tudo em cadeia.
Isso é uma projeção realista, porque no mínimo as empresas vão ter que dispensar 10% dos funcionários, ninguém vai aguentar pagar. Fora a quebradeira, tem aqueles que vão aguentar com menos funcionários, mas tem aqueles que nem vão aguentar. Setor de bar e restaurante, não sei como esses caras vão aguentar.
O shopping tem 110 mil lojas no Brasil. São 40 mil, 50 mil lojas no Estado de São Paulo. O shopping hoje não representa a totalidade, o maior comércio está na rua, 80% está na rua, e a rua foi fechada também. A hora que você começa a botar na mesa, os números são astronômicos. A pergunta que eu faço é: quando fechou lá pós-Natal e no início de ano, qual foi o resultado? Aumentou o número de casos. Porque ele deu férias para todo mundo, todo mundo foi para a praia, foi para balada.
R7 - Na visão do senhor, por que o comércio tem "pagado a conta" no endurecimento das medidas sanitárias?
Júnior - Nós estamos pagando a conta. Dia 27 e 28, emendou final de semana, o funcionário saiu rindo porque foi à praia e voltou para trabalhar na segunda. E no outro final de semana foi à praia comemorar Ano Novo. Por que não fechou a praia? Por que não falou com os prefeitos? Você acha que o que está morrendo de gente agora é porque o cara foi ao shopping e pegou o vírus? Foi nada, foi todo mundo que foi para a praia, para a balada e trouxe o vírus, ninguém trouxe o vírus de dentro de loja, de shopping. Você escuta alguém falar que foi no salão de beleza e se contaminou? Não é nem 10%. Eu quero saber se a praia está fechada, pega o final de semana agora como tava e como vai ser o próximo. Pega lá quantas pessoas passaram no pedágio, quantos milhões de pessoas vão para a praia. Criou dois feriados prolongados (com as novas restrições ao fim de semana). E não vai resolver o problema do hospital, não vai diminuir a propagação. O shopping é mais seguro que a praia, se ele [funcionário] está trabalhando, ele está mais seguro que na praia.
R7 - Na visão do setor, há como manter os serviços não essenciais abertos e manter o distanciamento social pregado pelas autoridades sanitárias?
Júnior - Claro, por exemplo, você não entra no shopping sem medir a temperatura. Todos os shoppings têm álcool em gel nos corredores, nas lojas, se você andar sem máscara vem segurança na hora e manda colocar. Você só pode tirar a máscara para comer com distanciamento. O restaurante está respeitando o protocolo da distância. Se você pegar um sorvete, antes saía no corredor lambendo, hoje não pode. Tem que consumir no estabelecimento. A praça de alimentação está toda adequada para as distâncias conforme os protocolos, eu vi a declaração de vários imunologistas, não é o comércio, é a balada.
Aí [com as novas medidas] vai juntar todo esse pessoal que trabalha em shopping, para fazer pagode sábado à tarde, juntar um monte de gente sem máscara. Cada cidade tem que ser responsável, fecha a praia, faz o que for. Deixa todo mundo na capital trabalhando.
R7 - As lojas que não fecharem definitivamente vão para o mercado online, certo?
Júnior - Eu não tenho dúvida que vai ser isso. O online funciona muito bem quando tem o físico, o online e o físico são um conjunto. Pega aí o maior vendedor do online no Brasil: hoje é o Magazine Luiza, e tem o físico, suportando entrega. A única coisa que vai haver é que vai ter que ter uma readequação do custo desse físico. Hoje no shopping o custo é muito alto, então vai ter que ter uma readequação, se não a conta não vai fechar. E ainda mais com toda essa restrição. A rua vai ser protagonista, assim como o online.
R7 - Os empreendedores de shopping pressionam também os lojistas? Está havendo flexibilidade nas negociações?
Júnior - Alguns shoppings estão flexibilizando, mas existe uma boa parte que não flexibilizou nada, ainda existe uma pressão. Eles falam que flexibilizaram lá no passado, presidente da Abrasce fala de R$ 5 bilhões de renúncia. Ele não renunciou nada, não podia cobrar se as lojas estavam fechadas. Por lei você não pode cobrar, o contrato não foi cumprido, ele não entregou o objeto do contrato, então isso que ele fala é só para justificar as pressões que eles fazem hoje. Com as lojas fechadas, alterou-se o contrato, seja por pandemia seja por qualquer coisa, alterou. O objeto do contrato não é mais o mesmo. Você quando contratou uma loja dentro de um shopping, você contratou porque ali tem fluxo, se não tem fluxo por seja lá qualquer razão, e a lei diz isso, você tem que alterar o contrato, alterar a cobrança, essa é a luta, e acho que muitos não estão entendendo isso. Se eles renunciaram R$ 5 bilhões, o varejo deixou de vender R$ 60 bilhões.
R7 - Entrar na Justiça será o caminho para muitos lojistas? Como você enxerga isso? Vai haver uma chuva de processos?
Júnior - Olha, se as pessoas não aguentarem, se não chegarem a um acordo comercial que equilibre essa relação, só há um caminho, que é o Judiciário. O que a grande maioria está fazendo é esgotar, até onde dá, a negociação comercial, caso o contrário, entra na Justiça para se defender. As pessoas têm lá suas economias, investimentos, de anos. De repente a pessoa vendeu uma casa, um carro, para montar um negócio na esperança de ser algo lucrativo, de repente vem uma pandemia e você sofre essa pressão, não é justo que você seja tão penalizado.
Pelo IBGE, 99,1% do varejo é formado por pequenas e médias empresas. Então quem mais emprega nesse país é o pequeno. É o pequeno que está tomando a porrada, o grande está dando risada porque tem benefício no shopping. Para o grande, quanto mais o pequeno sofrer num shopping melhor fica para ele. Porque ele não tem o custo do pequeno, então quanto mais o pequeno sofrer, quanto mais loja fechar, mais vai sobrar pro grande, isso é injusto, os empreendedores criaram uma grande armadilha, beneficiaram tanto os grandes, que agora não sabem como fazer, porque nunca foi o grande que deu a maior rentabilidade, sempre foi o pequeno que sempre deu a maior rentabilidade da locação, por isso que eles gostam de negociar individual, para pressionar.
Fonte: R7
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