O Brasil se aproxima do fim da terceira onda de Covid-19, causada pela variante Ômicron, segundo a avaliação do último boletim do Observatório Covid-19 da Fiocruz (Fundação Oswaldo Cruz).
A publicação aponta que o país registrou a menor marca de óbitos pela doença desde maio de 2020, com uma taxa de 0,3 por 100 mil habitantes, além de uma redução considerável do número de novas infecções e internações nos leitos de UTI (unidade de terapia intensiva) do SUS.
Apesar da imprevisibilidade com que o Sars-Cov-2 pode sofrer mutações com potencial para causar preocupação e com novos aumentos de casos, a perspectiva para o terceiro ano de pandemia é otimista, segundo especialistas ouvidos pelo R7.
Para Christovam Barcellos, pesquisador do Observatório Covid-19, a forma como a população aderiu à vacina foi importante para que a terceira onda se mostrasse menos letal do que a causada pela variante Gama, por exemplo.
“Por enquanto estamos comemorando essa queda da mortalidade, alívio nos hospitais, mas isso pode, infelizmente, voltar com uma nova variante. O que temos observado é um dano muito menor do que as outras ondas [causaram], muito devido à vacinação. Mesmo a Ômicron sendo uma variante que causa menos problema, ela foi muito mais danosa em países com baixa vacinação, como o leste europeu, a África e a Índia, que tiveram grandes crises durante essa onda”, afirma.
Atualmente, mais de 76% da população brasileira está completamente vacinada contra a doença, deste total, cerca de 39% já recebeu a dose de reforço, de acordo com o Vacinômetro do R7.
Barcellos destaca que o momento permite mais tranquilidade em relação às medidas de proteção, como mostra a tendência de alguns estados e municípios de derrubarem a obrigatoriedade do uso de máscaras em ambientes fechados e ao ar livre, com exceção de transportes públicos, unidades de saúde e no transporte aéreo.
“Houve um pouco de aglomerações durante as férias [escolares] e o Carnaval, que coincidiram quase que com o auge da onda causada pela Ômicron, e felizmente não notamos um impacto muito grande. Hoje é possível ter um pouco de relaxamento, mas, claro, evitando locais muito fechados e aglomerações, e sempre usar máscara para evitar situações que podem colocar as outras pessoas em risco”, afirma o pesquisador.
Variantes de preocupação e seus efeitos
Apesar de terem características genéticas diferentes, a cobertura vacinal pode ser uma das explicações de porque mesmo sendo mais transmissível, a Ômicron causou menos mortes do que a variante Gama, responsável pela segunda onda da pandemia no Brasil no primeiro semestre de 2021, período em que o país registrou mais de 300 mil mortes por Covid-19.
No final de março de 2021, a média móvel de novas infecções causadas pela Gama chegou a 77.129 no seu maior pico, enquanto o maior índice da média de óbitos foi de 3.124 em meados de abril, segundo dados do Conass (Conselho Nacional de Secretários de Saúde).
Vale destacar que a campanha de imunização havia acabado de começar no país e avançava a passos lentos em um cenário de escassez de vacinas.
Por outro lado, em fevereiro deste ano – quando mais de 72% da população estava completamente vacinada – a maior média móvel de novas infecções provocadas pela Ômicron foi de 189.526, com um recorde de quase 300 mil novos casos de Covid em apenas um dia, enquanto a maior média de óbitos foi de 951 no mesmo mês.
Neste sentido, o geneticista Renan Pedra, professor de genética da UFMG (Universidade Federal de Minas Gerais), explica que a perspectiva em relação a novas variantes é de que elas não sejam “dramaticamente piores do que as que já circularam durante a pandemia”.
“Com a Ômicron tivemos um status vacinal nunca observado para nenhuma outra variante, então isso reduz a letalidade. O que não esperamos é que surja uma variante que leve a uma doença muito grave e cresça em grande quantidade de frequência, porque o vírus também tem como objetivo, de certa forma, sobreviver. Então, se ele entra e mata o hospedeiro muito rápido, aquilo atenta contra a capacidade dele de progredir e de se multiplicar”, afirma o geneticista.
Apesar disso, o especialista ressalta que o processo de mutação acontece de forma aleatória, então não há garantias de que o perfil das variantes siga a tendência de ser mais transmissível e menos letal.
Pedra também destaca que as cepas têm mostrado um comportamento diferente no Brasil em comparação com o restante do mundo. A Delta, por exemplo, causou preocupação na Europa e na Índia, mas passou despercebida pelos brasileiros. Assim como a BA.2, subvariante da Ômicron, que já se tornou mundialmente dominante, mas não provocou uma nova explosão de casos no país.
De acordo com o geneticista, ainda não há explicações científicas de por que o comportamento das variantes é diferente entre os brasileiros, mas já existem algumas hipóteses.
Uma delas é a de que a imunidade conferida pela Gama pode ter contornado o efeito das outras mutações – vale destacar que essa cepa foi identificada primeiramente no Brasil e não causou grandes efeitos em países da Europa ou da América do Norte, por exemplo, regiões que enfrentavam, à época, as variantes Alfa e Beta.
“Como cientista, tenho algumas hipóteses que precisam ser testadas em laboratório: tem a particularidade da Gama e, eventualmente, por nossa população ter esse histórico de miscigenação, cria um conjunto genético muito diferente dessas populações da América do Norte, por exemplo, [o que] talvez pudesse contribuir, mas não temos uma resposta fechada”, afirma o especialista.
Imunidade contra o vírus
Estudos indicam que a vacinação completa oferece uma proteção adicional a quem já teve Covid-19, isto é, potencializa a imunidade natural adquirida após a infecção. Vale destacar que nenhuma vacina anti-Covid em aplicação no mundo é capaz de impedir totalmente que o vírus entre no organismo, mas são comprovadamente eficazes para evitar casos graves e mortes pela doença.
Neste sentido, Christovam Barcellos ressalta que, apesar de ser um dado positivo, ainda não se sabe por quanto tempo essa imunidade pode durar.
“O nosso medo é de que daqui a seis meses nós vamos precisar de uma vacina de reforço ou uma renovação das vacinas que já existem, porque pode surgir uma variante que ameace o sistema imunológico novamente”.
A resposta para esta questão, segundo o geneticista Renan Pedra, pode vir da Europa, onde os países iniciaram a vacinação antes do Brasil e também passaram pelos efeitos da Ômicron primeiro.
“É preciso monitorar isso, porque pode ser que, eventualmente, tenhamos um declínio da resposta imune que hoje está apropriada, e precisaremos entender como isso pode afetar o cenário epidemiológico da doença”, explica.
Além disso, frente a redução considerável do número de novos casos de Covid-19, o especialista ressalta a importância de seguir com o sequenciamento genético das amostras coletadas e o rastreio de novas variantes, não só para entender como a circulação do vírus tem se mantido no Brasil, como para prever a possibilidade de novas ondas.
Fim da pandemia
Mesmo com a melhora dos índices da doença no país, os especialistas alertam que ainda é cedo para pensar em uma previsão para o fim da pandemia, ou mesmo para que a doença seja reclassificada como uma endemia no país.
“Já tivemos quatro mutações importantes desse vírus, pode surgir nos próximos meses uma nova variante que atinja o mundo inteiro. É possível manter baixo esse patamar de óbitos e de necessidade de internação, mas, infelizmente, precisamos ficar sempre alerta. O papel da Saúde Pública é sempre pensar as possibilidades de alguém adoecer mesmo vacinado, e incentivar a vacina”, afirma Barcellos.
A OMS (Organização Mundial da Saúde) decidiu, na última quarta-feira (13), manter a Covid-19 no status de pandemia, como uma emergência de saúde internacional pela imprevisibilidade com o que o coronavírus evolui.
O diretor-geral da organização, Tedros Adhanom Ghebreyesus, destacou a importância de prosseguir com os esforços para que as vacinas e tratamentos contra a doença sejam distribuídos de forma equitativa entre os países.
Fonte:R7
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