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24/10/2022 14:15
Política

Rishi Sunak é escolhido pelo Partido Conservador como novo premier

Ele será a primeira pessoa não branca a governar os britânicos
Ex-ministro das Finanças do Reino Unido, Rishi Sunak, deixa escritório no centro londrino / Foto: DANIEL LEAL/AFP
Redação com O Globo

 O Reino Unido terá pela primeira vez em sua História um chefe de governo não branco, hindu e descendente de indianos. Após a desistência dos outros concorrentes, os parlamentares do Partido Conservador escolheram nesta segunda-feira o ex-ministro das Finanças Rishi Sunak como seu líder e, consequentemente, como o terceiro primeiro-ministro que os britânicos terão em sete semanas — e o segundo consecutivo a não ser escolhido pelo voto popular.

Vice na disputa que levou Liz Truss ao poder no mês passado, Sunak é defensor de uma maior ortodoxia econômica e terá como missão principal consertar o caos herdado de sua antecessora. Pressionada após seu plano econômico ultraliberal provar-se catastrófico, ela renunciou na quinta após 44 dias no cargo, aumentando os problemas para um partido humilhado e para um país à beira da recessão, onde a inflação de 10,1% em termos anualizados é a maior em quatro décadas.

— Poder servir ao partido que eu amo e retribuir a este país para o qual eu devo tanto é o maior privilégio da minha vida — disse Sunak em uma breve declaração. — O Reino Unido é um grande país, mas não há dúvidas de que enfrentamos um desafio econômico profundo. Agora precisamos de estabilidade e unidade, e farei de minha prioridade principal unir o nosso partido e o país — completou ele, prometendo "servir com integridade e humildade" e trabalhar "noite e dia".

Como o Partido Conservador tem a maioria no Parlamento desde as eleições de 2019, seu líder torna-se também chefe de governo no sistema parlamentarista britânico. Pelo processo partidário, é de praxe que a decisão final passe pelos seus filiados, mas desta vez nem isso ocorreu: em regras aceleradas, a escolha coube exclusivamente aos deputados conservadores.

O novo e multimilionário premier é o segundo consecutivo a não ser escolhido pelo voto direto, o que leva a oposição a questionar seu mandato e pedir a antecipação do pleito previsto para janeiro de 2025 — algo que Sunak já indicou que não irá fazer. Ele será empossado em uma audiência na terça com o rei Charles III, transformando-se aos 42 anos no governante mais jovem do país desde o século XIX.

Cada candidato à liderança partidária precisava receber o endosso de ao menos 100 dos 357 parlamentares da legenda até às 14h desta segunda (10h no Brasil). Sunak já tinha 202 apoiadores quando sua adversária restante, a ex-secretária do Comércio Exterior Penny Mordaunt, divulgou um comunicado a um minuto do prazo final anunciando sua desistência e declarando "apoio total a Rishi".

Mordaunt teve o apoio de 90 colegas, segundo o Financial Times, dez a menos que o necessário para que a decisão fosse encaminhada aos filiados do Partido Conservador. Se ela alcançasse 100, os conservadores de carteirinha participariam de uma votação on-line até sexta.

Pedidos de eleição geral

A decisão, ainda assim, seria pouco representativa dos britânicos: o Partido Conservador tem apenas 172.437 filiados, ou 0,3% dos 66 milhões de habitantes do país. Como Sunak, também são majoritariamente homens, mas ao contrário do novo líder conservador, são brancos e de idade mais avançada.

Os pedidos por eleições antecipadas vieram imediatamente de grupos opositores e até mesmo de correligionários críticos ao seu novo líder. Para os conservadores, ir às urnas neste momento seria catastrófico: segundo o agregador de levantamentos do site Politico, o partido governista teria 21% dos votos, contra 53% dos trabalhistas. A aliados, o novo líder classificou a situação atual da legenda como uma "ameaça existencial".

"Os conservadores coroaram Rishi Sunak como primeiro-ministro sem que ele dissesse sequer uma palavra sobre como governaria o país, e sem que ninguém tivesse a possibilidade de votar", disse a vice-líder trabalhista, Angela Rayner, em comunicado. "Precisamos de uma eleição geral para que o público tenha voz no futuro do Reino Unido", completou ela, fazendo críticas similares a dos verdes e dos liberais-democratas.

Além da desistência de Mordaunt, outro fator-chave para que a disputa conservadora não se prorrogasse por uma semana foi a decisão do ex-premier Boris Johnson não tentar um segundo ato. Apesar de Boris dizer que havia conseguido o apoio de mais de 100 colegas, incluindo sete ministros, apenas cerca de 60 nomes o endossavam formalmente até domingo.

Grandes desafios

Ainda há resistência ao ex-premier, cuja queda ocorreu após meses de escândalos sucessivos, de festas na sede do governo durante a quarentena para a Covid-19 à promoção de aliados acusados de assédio sexual. Foram as renúncias de Sunak e de seu amigo Sajid Javid, então ministros das Finanças e da Saúde, que catalisaram a queda de Boris no início de julho.

 

A manobra fez correligionários críticos acusarem Sunak de implodir propositalmente o governo, mas o consolidou como um dos favoritos à sucessão, chegando a vencer na fase preliminar daquela corrida, restrita ao voto dos parlamentares. A decisão final coube aos filiados do Partido Conservador, contudo, que preferiram as promessas de Truss: entre elas, os maiores cortes fiscais em 50 anos, sem medidas compensatórias.

Já Sunak prometia "consertar a economia", mantendo os impostos até que a situação pós-pandemia, complicada pelo divórcio britânico da UE e pela crise energética desencadeada pela guerra na Ucrânia, se ajeitasse. O mercado reagiu bem à sua vitória, com os títulos da dívida britânica registrando ganhos e a libra chegando a aumentar 0,9%.

A tendência é que ele mantenha Jeremy Hunt, outro defensor do conservadorismo fiscal, à frente das Finanças — Hunt foi nomeado há apenas 10 dias, em uma tentativa fracassada de Truss salvar seu próprio pescoço. Um plano a médio prazo para reduzir a dívida britânica deve ser apresentado ao Parlamento no dia 31 de outubro, como planejado antes mesmo da troca em Downing Street.

Promessas econômicas

Sunak tornou-se um dos políticos mais célebres do país em 2020 com seu enorme pacote de auxílios para mitigar os efeitos da Covid-19. Após os benefícios chegarem ao fim e o impacto da crise ficar claro, contudo, viu a popularidade minguar, impacto piorado após ser multado, tal qual Boris, por participar de festas durante a quarentena.

Muitos críticos também acusam o novo líder conservador de estar desconectado da realidade da maioria dos britânicos: parlamentar mais rico de todo o Reino Unido, acumulou uma fortuna estimada de 730 milhões de libras (R$ 4,37 bilhões) trabalhando para empresas financeiras como a Goldman Sachs. A percepção não é favorecida pelo seu casamento com a filha de um bilionário indiano — que nos últimos meses se viu envolvida em um escândalo por não pagar Imposto de Renda no Reino Unido.

Independentemente dos aspectos políticos, contudo, analistas apontam para a simbologia de sua ascensão ao comando de um país cujo poder é indissociável da exploração de outros povos — até o início do século passado, o império britânico englobava quase um quarto do planeta, inclusive a Índia. Sunak chega ao poder também apenas oito anos após o referendo do Brexit, divórcio que ele mesmo apoiou, mas que foi fortemente motivado pelo sentimento anti-imigração.

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