A eleição de 2022 é a primeira que Marcela Craveiro, 36 anos, acompanha de perto. Entretanto, após o primeiro turno, a supervisora de marketing optou por se afastar dos noticiários e reduzir o consumo de informações sobre o tema para proteger a
“Acompanhei a apuração o dia inteiro até a finalização do resultado. No dia seguinte, já acordei esgotada, e ainda fiquei toda a manhã em busca de mais notícias. Nas redes sociais, é muito fácil ficar um dia inteiro absorvendo conteúdos que nem sempre fazem bem”, relata.
A estratégia que está funcionando para ela é reduzir o tempo online. “Percebi que estava muito estressada. Para não me prejudicar, estabeleci uma rotina de consumir conteúdo apenas por um período curto do dia.”
O desgaste vem desde antes da disputa eleitoral, conta a mulher. Apesar de tentar levar a pauta com leveza, as discussões sobre política e candidatos foram ficando cada vez mais tensas no convívio de Marcela nos últimos meses — e ela, mais inflexível. “Com a proximidade das eleições, senti as pessoas, inclusive eu, mais intensas em suas opiniões, dificultando as conversas.”
Divergência política na família de Marcela existe. E muito. Ela conta que até tentava dialogar e ouvir os diferentes pontos de vista, mas preferiu ausentar-se das conversas pelo menos até o 2° turno. m uma distribuição de votos acirrada, que terminou em uma diferença de 5,2 pontos — 48,4% de Lula (PT) contra 43,2% de Bolsonaro (PL) —, o momento de apuração foi o mais estressante para a designer gráfica Thaís Xavier, de 29 anos.
Angustiada e com receio de violência, Thaís também evita discussões, inclusive com pessoas próximas. “Neste ano, os sentimentos estão mais instáveis e a discordância, gritante. Principalmente entre familiares e grupos de amigos.”
A polarização política é um fator considerável para a instabilidade dos brasileiros nas eleições deste ano, acredita Rafaella Gato. Aos 41 anos, a médica pediatra percebe que as conversas sobre a temática estão mais exaltadas do que nos últimos pleitos:
“A política é vista de forma passional, como um time de futebol. As emoções são ainda mais fortes quando os atores principais são polarizados. Nestas eleições, temos uma questão de valores muito grande entre dois polos que estão disputando. Nossos ânimos sempre estão à flor da pele por isso.”
Com familiares políticos, o assunto sempre foi presente na vida de Rafaella. Mesmo acompanhando de perto há anos, o 1° turno de 2022 foi o primeiro que a causou crise de ansiedade. “Não imaginava que chegaria ao nível de estresse que cheguei. Nunca havia ficado tão ansiosa em outras eleições”, diz.
Sobre as perspectivas para as próximas semanas, a médica se diz preocupada. No momento, ela tenta evitar situações de conflito para se proteger de uma “vulnerabilidade emocional”.
“Simultaneamente, tento ganhar terreno e debater com pessoas com potencial de escuta. Apesar de tudo, não podemos fugir da luta nesse momento”, completa. até o segundo turno da disputa presidencial. O cenário que se desenhou no primeiro turno trouxe uma mistura de sentimentos, principalmente, para os que foram surpreendidos negativamente. Para Marcela, o resultado foi cansaço e nervosismo acentuados pelo conteúdo nas redes.
O psicólogo Roberto Debski acredita ser válido se esquivar de discussões — cara a cara e online — até os ânimos dos brasileiros com o cenário eleitoral se acalmarem. “Há temas que serão sempre sensíveis, portanto devem ser conversados com moderação. Política é um deles. Se você percebe não ter condições de falar sem entrar em briga, ou vai conversar com alguém que é assim, é mais prudente evitar o assunto”, destaca.
“Antes de entrarmos em uma discussão, devemos nos conhecer e saber os limites e dificuldades. Essa percepção evita que a conversa escale para um rompimento de relação, ou até pior, como agressões e fins trágicos”, completa o especialista.
Instabilidade é resultado de uma eleição agressiva, diz especialista
Psicóloga psicanalista, Suzani Marques Palma Duarte, acredita que a forma como as eleições são representadas influencia nos sentimentos sentidos durante o processo e no resultado. Se for vista como guerra em que só existe um vencedor e um sobrevivente, a reação dos eleitores contrários será de frustração e sensação de ameaça, explica a especialista.
Para Suzani, a eleição presidencial deste ano evidencia “dificuldade social de tolerar e dialogar”. “Quando não se trata da construção de uma sociedade onde todos podem unir suas diferenças e renunciar as suas satisfações imediatas, o nervosismo e a agressividade ganham espaço porque a vitória de um implica na destruição do outro”, esclarece.
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