As crianças Yanomami resgatadas com desnutrição "são pequenas, emagrecidas, caquéticas, com o cabelo já mais ralo, e a pele descamando", descreve o pediatra Eugênio Patrício, um dos médicos que atende os pacientes no Hospital da Criança Santo Antônio, em Boa Vista.
A unidade tem um total de 53 crianças Yanomami internadas. A maioria dos casos é de desnutrição grave e malária.
Desse total, sete crianças estão na UTI - dessas, três estão intubadas. Indígenas Yanomami enfrentam uma grave crise sanitária no território, o maior do Brasil, causado pelo avanço do garimpo ilegal e pela falta de assistência do governo federal.
O pediatra, que é responsável pelo setor de cuidados prolongados, onde os pacientes precisam de tratamentos com diagnósticos considerados complexos - como é o caso dos Yanomami.
"A grande maioria das crianças Yanomami que chegam até nós vêm com desnutrição de moderada para grave".
"Não é uma desnutrição de um mês ou dois, é desde o nascimento. Elas são pequenas, emagrecidas, caquéticas, com o cabelo já mais ralo, a pele descamando, que são os sinais de que essa desnutrição se manteve por um bom tempo", afirmou.
A preocupação maior, para Eugênio, é com as crianças que estão na Unidade de Tratamento Intensivo (UTI). Qualquer outro diagnóstico médico fica agravada pela desnutrição.
"Quando uma criança vai para a UTI é porque ela necessita de um cuidado extremamente intensivo. E sim, há o risco de até 50% de chance de que elas não sobrevivam. Uma criança que tem uma nutrição adequada tem a capacidade de sair de uma infecção grave. Mas, para uma criança desnutrida, é difícil".
Atualmente, crianças Yanomami internadas no hospital infantil representam 82,8 % de todos os 64 indígenas de outros povos atendidos na unidade.
Há casos em que as crianças resgatadas chegam a pesar duas vezes menos do que deveriam. Como o caso da menina 4 anos, com 9,9 kg – o equivalente a um bebê de 8 meses –, quando o ideal seria 16 kg para a idade dela.
A diretora-geral do Hospital da Criança, Francinete Rodrigues, disse que essa quantidade de 53 Yanomami internados pode ser considerado expressivo. Desde o dia 16, equipes do Ministério da Saúde fazem o resgate de crianças na comunidade e mandam para Boa Vista os casos que precisam de internação.
“A gente diz alto porque não é de costume ter esse número, hoje nós temos 64 indígenas [sendo 53 Yanomami] no hospital. Então, é um número expressivo. Mas, a gente está conseguindo trabalhar e conseguindo dar conta no momento", disse.
Situação Yanomami
Maior reserva indígena do país, a Terra Yanomami está no centro do debate nacional após dezenas de denúncias revelarem o caos sanitário na saúde. São relatos e imagens que expõem indígenas extremamente desnutridos e com malária, abandonados pelo governo.
Autoridades locais, líderes indígenas, organizações e ambientalistas afirmam que a maior causa para se chegar ao atual caos sanitário da reserva foi o avanço do garimpo, frente à omissão do estado brasileiro em assegurar a proteção do território e, consequentemente, aos Yanomami.
Em dezembro do ano passado, o g1 e a GloboNews mostraram imagens de crianças Yanomami sofrendo com desnutrição grave na Terra Indígena. As fotos, divulgadas pela associação Urihi Associação Yanomami, revelaram meninos e meninas extremamente magros e com costelas aparentes.
Em 2021, o g1 e o Fantástico já tinham registrado cenas inéditas e exclusivas de crianças extremamente magras, com quadros aparentes de desnutrição e de verminose, além de dezenas de indígenas doentes com sintomas de malária em comunidades Yanomami.
O atual governo estima que ao menos 570 crianças morreram na região nos últimos quatro anos, vítimas de desnutrição, malária, pneumonia e contaminação por mercúrio. Em 2022, foram 99 mortes de crianças.
Após várias imagens e relatos de avanço de doenças na Terra Yanomami, o Ministério da Saúde declarou emergência de saúde pública para combater desassistência de indígenas no território.
O governo federal também criou o Comitê de Coordenação Nacional para discutir e adotar medidas em articulação entre os poderes para prestar atendimento a essa população.
O plano de ação deve ser apresentado no prazo de 45 dias, e o comitê trabalhará por 90 dias – prazo que pode ser prorrogado.
Após visitar a reserva, o secretário de Saúde Indígena (Sesai) do Ministério da Saúde, Weibe Tapeba, disse que o cenário é de guerra e planeja instalar dentro da reserva um hospital de campanha para atender os inúmeros indígenas doentes.
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