"Estamos até correndo risco de pegar Covid-19, pondo a nossa vida em risco". O desabafo é de um detento, em uma carta em que pede ajuda a familiares para denunciar as condições do Centro de Detenção Provisória (CDP) de Praia Grande, no litoral de São Paulo. Além dessa carta, direcionada à esposa do interno, outros presos se uniram e fizeram um manuscrito de sete páginas, onde alegam diversos problemas, como falta de água, de medicamentos, alimentos estragados, demora dos Correios e surtos de doenças. A Secretaria da Administração Penitenciária (SAP) nega as más condições apontadas.
O G1 entrevistou três esposas de detentos, que preferiram não se identificar por medo de represálias. As cartas enviadas às mulheres retratam a situação enfrentada pelos presos que cumprem pena na unidade, segundo a visão deles. À reportagem, elas afirmaram que há um medo constante de que os esposos sejam acometidos por alguma doença, e que, com a pandemia, a situação tem se tornado cada vez mais precária.
"Eles estão presos, pagando pelos erros, mas não precisam ser humilhados da forma como estão sendo. Eles estão sendo tratados como bicho. Eles estão à mercê da sorte e da providência de Deus", disse uma das esposas ao G1.
Na carta enviada por um detento, ele afirma que "a cada dia que passa fica mais difícil". Dentre os problemas citados, ele comenta sobre a situação da saúde, falta de água e dos castigos constantes. A principal questão é o medo da infecção pela Covid-19 em situações insalubres. "Fico com medo de pegar essa doença, eu já tenho a imunidade baixa, eu já tive tuberculose, quase morri, Deus me livre pegar essa doença. Assistência médica não existe, descaso total", descreve em um trecho.
O tópico saúde também foi citado no manuscrito produzido por diversos detentos. Entre 17 reivindicações, a segunda pede um melhor núcleo de saúde. "Desde o início da pandemia, nesta unidade, não temos um médico para fazer as avaliações corretas, para diagnosticar e receitar os remédios necessários", diz um trecho. Em seguida, vem o tópico da alimentação, em que eles apontam terem recebido comida estragada.
A esposa de outro detento relata que as mulheres se comunicam entre si, e as reclamações deles são similares. "Tem outro e-mail em que ele relata que ficaram 24 horas sem água. Lá tem surtos de sarna e furúnculo. Eu mandei sabonete de sarna, porque meu marido começou a ter coceira. Todos os presos estão. Nas conversas, elas falam que os maridos têm uma das duas doenças. A gente sabe que [o detento] errou, mas é um ser humano", desabafa.
Na carta feita pelos detentos, eles abordam diversos assuntos, como as visitas, a precariedade da saúde, alimentação, falta de água, demora do Sedex, demora de cartas e e-mails, kits de higiene, castigos e questões sobre o atendimento com advogados. "Essa unidade prisional usufrui de uma conduta arbitrária, abusiva e desumana", citam em um trecho.
SAP nega más condições
O G1 questionou a Secretaria da Administração Penitenciária sobre as denúncias feitas nas cartas e por familiares dos detentos. A pasta negou as afirmações. Confira a nota na íntegra:
"As informações não procedem. No Centro de Detenção Provisória de Praia Grande, não há racionamento de água, e os presídios seguem o que determina a Organização Mundial da Saúde, que estipula o consumo mínimo per capita de 100 litros diários de água por pessoa por dia.
Os reeducandos recebem normalmente as medicações contra HIV, tuberculose e remédios psicotrópicos. A disponibilidade de medicação é realizada por meio da supervisão dos funcionários, e não há registro de ausência de fármacos. O CDP também não registra surtos de sarna e casos de furúnculos. A equipe de saúde da unidade atende os custodiados e os casos mais complexos são encaminhados à rede pública de saúde. De 2020 até agora, houve um óbito na unidade prisional, em janeiro deste ano, e que ocorreu no Hospital Municipal Irmã Dulce. A causa da morte foi atestada como câncer de pulmão.
A alimentação do CDP é fornecida desde 1º de outubro de 2018 pelo Centro de Progressão Penitenciária 'Dr. Rubens Aleixo Sendin', de Mongaguá, e é preparada pelos reeducandos daquela unidade. Ela é fiscalizada antes de ser servida aos presos do CDP e não há possibilidade de alimentos conterem insetos e materiais cortantes. São servidas três refeições por dia [café, almoço e jantar], como normalmente acontece em todas as unidades do estado. A comida é balanceada e segue cardápio previamente estabelecido e devidamente elaborado por nutricionistas, respeitando a legislação vigente.
A entrega via correspondência de itens enviados pelos familiares, os chamados 'jumbos', ocorre normalmente. Produtos perecíveis não são permitidos para envio, justamente para evitar que estraguem.
A SAP segue todas as determinações do Centro de Contingência do Coronavírus. Medidas de higiene preconizadas pelos órgãos de saúde foram aplicadas, inclusive com a suspensão de atividades coletivas. A limpeza das áreas foi intensificada, a entrada de qualquer pessoa alheia ao corpo funcional foi restringida, além de determinada a quarentena para os presos que entram no sistema prisional. Os grupos de risco são monitorados e foi ampliada a distribuição de produtos de higiene, álcool em gel e sabonete e distribuição de EPIs [Equipamentos de Proteção Individual].
O Estado de São Paulo já distribuiu cerca de 7 milhões de máscaras reutilizáveis para presos e funcionários, incluindo mais de 83 mil máscaras do tipo N95/PFF2. Além das máscaras, foram entregues aos presídios quase 3 milhões de luvas descartáveis, mais de 132 mil litros de álcool em gel e 103 mil litros de sabonete líquido, entre outros insumos".
Fonte: G1
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